O direito ao esquecimento e o regulamento geral sobre a proteção de dados: entre garantias e ameaça à liberdade de expressão

AuthorRaquel C. M. Belay
ProfessionAluna de Graduação em Direito da Uerj
Pages31-47
O DIREITO AO ESQUECIMENTO E O REGULAMENTO GERAL
SOBRE A PROTEÇÃO DE DADOS: ENTRE GARANTIAS E
AMEAÇA À LIBERDADE DE EXPRESSÃO
raqueL C. M. BeLay1
Resumo
O presente artigo trata do direito ao esquecimento no âmbito da União Euro-
peia e visa a determinar se o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados
constituirá um avanço em relação à proteção do direito. Inicialmente apresenta
um esclarecimento quanto à nomenclatura e, em seguida, a sua evolução histó-
rica — a Diretiva de 1995 e o caso Google v. Espanha. Na segunda parte aborda
algumas novidades do Regulamento, que conferem maior efetividade ao direi-
to, e na terceira, os seus limites. Conclui que, conquanto as regras evidenciem
um progresso na proteção dos dados, não ultrapassam barreiras próprias à
web e deixam questões em aberto que podem traduzir-se em uma ameaça à
liberdade de expressão.
Palavras-chave
Direito ao esquecimento; right to erasure; desindexação; processamento de
dados e controlador de dados.
Introdução
Na era digital, os dados disponibilizados online podem gerar um grave impacto
na vida de um usuário. Com efeito, a natureza da internet, onde a liberdade
e a autonomia são a regra, permite que informações sejam facilmente publi-
cadas, acessadas e disseminadas. Assim, fatos que uma pessoa gostaria de
esquecer — por exemplo um comportamento do qual se arrepende ou uma
antiga contravenção, já socialmente irrelevante — podem atormentá-la devido
à capacidade da rede de manter a sua perpetuidade. Nesse sentido, o direito ao
esquecimento aparece como uma tentativa de mitigar esses efeitos perversos.
No seio da União Europeia, onde a vida privada e familiar e a proteção de
dados pessoais são classicados como direitos fundamentais (artigos 7º e 8º da
Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia, respectivamente), o direito
1 Aluna de Graduação em Direito da UERJ. Todas as traduções foram feitas pela autora.
32 REVISTA DO PROGRAMA DE DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA
ao esquecimento tem especial relevância. Desde 1995 há uma Diretiva prevendo
o direito de solicitar a exclusão de dados pessoais. Não obstante, 21 anos de
avanços tecnológicos revolucionaram a web, tornando as antigas previsões insu-
cientes. Por conseguinte, em 2012 a Comissão Europeia propôs o Regulamento
Geral sobre a Proteção de Dados para substituir a Diretiva (conhecido pela sigla
em inglês GDPR), cujo texto nal foi pactuado no dia 15 de dezembro de 2015.
Esta pesquisa tem por motivo a curiosidade em especicar qual será o
signicado do Regulamento para o direito ao esquecimento e limita-se estri-
tamente à União Europeia, não abordando as consequências especícas para
cada Estado-membro. O fato de que as novas regras valerão diretamente para
todos os cidadãos do bloco e poderão até estender seus efeitos a companhias
situadas fora do território da União sublinha a importância de estudar o tema.
O objetivo deste artigo é precisar se o Regulamento equivalerá ou não a um
avanço em relação à proteção do direito ao esquecimento. A partir da leitura do
texto convencionado, verica-se que são estabelecidas sanções para os controla-
dores de dados em caso de descumprimento dos preceitos relativos ao direito em
questão. Consequentemente, supõe-se que a resposta ao problema é armativa,
já que a imposição de penalidades desestimulará o descumprimento da garantia.
A primeira parte do trabalho versa exclusivamente sobre o direito ao es-
quecimento, sua nomenclatura e desenvolvimento histórico. Posteriormente,
discorre sobre as inovações do Regulamento e, na terceira parte, demonstra as
suas deciências.
1. Apresentação do direito ao esquecimento
Antes de analisar as inovações que o Regulamento trará para a UE em relação
ao direito ao esquecimento, é necessário denir no que ele consiste e o modo
como evoluiu ao longo do tempo. Nesta parte são inicialmente esclarecidas
questões terminológicas e então examina-se o caso Google v. Espanha, relacio-
nando-o com a Diretiva de 1995.
1.1 Conceito
Apesar da sua popularização graças à decisão do caso Google versus Espanha,
que apresentaremos no subitem seguinte, o termo “direito ao esquecimento”
continua sendo motivo de confusões. De acordo com Aurelia Tamò e Damian
George, “tanto na literatura quanto em discussões políticas há uma falta de
uniformidade em relação à denição do conceito global de “eliminação” de
dados pessoais2”.
2 GEORGE, Damian; TAMÒ, Aurelia. Oblivion, Erasure and Forgetting in the Digital Age. Jour-
nal of Intellectual Property, Information Technology and E-Commerce Law, vol. 5, 2014.

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